Em um ano de liberdade, Maria Lúcia se mostra maior que os 16 de cárcere

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Chegar até Maria Lúcia Almeida Braga, 37, não é fácil. Do centro de Uruburetama – 127,3 km distante de Fortaleza – ainda é preciso percorrer um caminho de cerca de 40 minutos de carro até uma localidade do município chamada comunidade do Retiro. De lá, carro fica, e os pés ainda nos levam por mais 20 minutos de caminhada em uma subida íngreme na região serrana. O fôlego falha um pouco mas a vista, no alto da serra, é de um sorriso bem facinho, um corpo robusto e roupas coloridas. Feições que nem de longe deixam aparecer a agonia de 16 anos trancada em um quarto.

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Hoje faz um ano que Lúcia foi libertada do cárcere doméstico onde passou mais de uma década em condições insalubres e sem convivência. Lá, no alto da serra, com cuidado, carinho e liberdade, ela mostra que um ano é maior que 16. E que, ainda assim, o caminho de chegada até ela é muito mais simples porque hoje ele é possível.

(foto:Fabio Lima/OPOVO)

Após engravidar, aos 20 anos, Lúcia foi trancada em um quarto pelos próprios familiares. No local, ela vivia em condições insalubres, sem roupas, sem acesso à banheiro e realizando as necessidades fisiológicas dentro do mesmo quarto e não tomava banho. Tinha apenas uma rede e uma janela estreita como única fonte de luz e recebia comida duas vezes por dia.

“Quando a Lucinha chegou aqui a gente não acreditava, ela corria, não falava, não conseguia ficar quieta, comia com a mão, não sabia ir ao banheiro, tirava a roupa, não sabia nem beber água, foi muito difícil”, explica Irene Braga, coordenadora do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) de Uruburetama.

Um ano depois, acolhida por Maria de Fátima Araújo, 57, e morando distante da família, Lucinha nos recebe sentada em uma pilha de tijolos na frente da casa. Conversa bem baixo, em palavras repetitivas, mostra a blusa colorida, tenta escrever o próprio nome em uma grafia ilegível, pede o batom pra ficar bonita e cumprimenta todo mundo. “Tudo bom?”. E tudo isso é tanta coisa. Diagnosticada com esquizofrenia e retardo mental, que foram agravados após a reclusão, ela é acompanhada mensalmente por profissionais do Centro de Atenção Psicossocial e é semestralmente acompanhada por um psiquiatra que se dispôs a atendê-la. Em outubro ela começou a receber um benefício de um salário mínimo. A casa onde mora com dona Fátima é pequena, tem dois cômodos e uma televisão, que Lúcia adora assistir. Quanto ao contato com o filho, Irene explica que houve uma tentativa de aproximação mas a família adotante pediu para não ter a integração “Ainda tem muito pra ela avançar, mas o que ela já teve de avanço por conta da questão de ter outra vida, mais acesso à comunidade que participa da vida dela de forma ativa, a gente faz o acompanhamento do benefício e como esta sendo usado, dos cuidados em saúde”. afirma Fabiana Alves, assistente social do Creas.

E Maria de Fátima, a cuidadora e agora a família de Lúcia tem toda a paciência. “Ela tá muito diferente. Isso de querer cuidar é coisa minha, eu sempre tive isso, coisa minha mesmo”, explica enquanto alisa os cabelos lisos de Lucinha. Ela lembra a mudança dela e prevê que os anos seguintes serão de mais avanços. Já a Lucinha, como boa anfitriã, se despede de nós com os gestos curtos e simpáticos, e corre para debaixo do cobertor para assistir à novela.

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