Einstein no Brasil: há 100 anos, o gênio da relatividade desembarcava para sua única visita ao país

A passagem do gênio da física pelo país marcou o incentivo às ciências puras e relembra a contribuição brasileira para a comprovação da Teoria da Relatividade.

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Há exatos 100 anos, o ícone da ciência Albert Einstein desembarcava no Rio de Janeiro para a sua primeira e única temporada no Brasil. Em 4 de maio de 1925, o físico alemão registrava em seu diário a impressão da chegada: “Chegada ao Rio ao pôr do sol, com clima esplêndido. Em primeiro plano, ilhas de granito de formato fantástico. A umidade produz um efeito misterioso”.

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Embora já tivesse passado rapidamente pelo país em março daquele ano, durante uma escala a caminho da Argentina, foi no fim de sua excursão pela América do Sul que Einstein permaneceu sete dias no Brasil, após visitar também Montevidéu. O objetivo da viagem era duplo: divulgar a recém confirmada Teoria da Relatividade e se aproximar das comunidades judaicas e alemãs, em meio à ascensão do Partido Nazista na Europa. A viagem foi organizada por entidades judaicas, com apoio de instituições científicas.

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Durante sua estadia, Einstein visitou a Fundação Oswaldo Cruz, o Museu Nacional, o Observatório Nacional e proferiu palestras na Academia Brasileira de Ciências e no Clube de Engenharia. Segundo o historiador Alfredo Tolmasquim, do Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST), a maior contribuição da visita foi o impulso dado às chamadas “ciências puras”, ainda incipientes no Brasil do início do século XX.

“O Brasil teve uma influência positivista muito forte no século XIX, que priorizava o uso prático da ciência. A visita de Einstein reforçou o debate sobre a importância da pesquisa fundamental, mesmo sem aplicação imediata”, explica Tolmasquim, autor do livro Einstein: o viajante da relatividade na América do Sul, que traduz os diários do físico e contextualiza o cenário científico brasileiro da época.

Apesar do entusiasmo com algumas iniciativas brasileiras, como a Rádio Sociedade — onde chegou a discursar ao vivo — e o trabalho do psiquiatra Juliano Moreira, Einstein demonstrou decepção com a falta de interlocutores especializados em física teórica. A carência de cientistas nas áreas básicas acabou levando o físico a se interessar mais por temas paralelos, como a história natural e questões sociais.

Contribuição brasileira à Teoria da Relatividade

Um dos momentos mais simbólicos da visita ocorreu em 9 de maio de 1925, quando Einstein conheceu o diretor do Observatório Nacional, Henrique Morize. Morize havia liderado, junto com o astrônomo argentino Charles Perrine, a histórica expedição ao município de Sobral, no Ceará, em 1919, durante um eclipse solar. Na ocasião, foi possível comprovar experimentalmente o desvio da luz de estrelas ao passar próximo ao Sol — uma das previsões da Teoria da Relatividade Geral.

“O problema que a minha mente imaginou foi resolvido aqui no céu do Brasil”, reconheceu Einstein diante dos cientistas brasileiros.

O atual diretor do Observatório, Jailson Alcaniz, destaca que, embora outras expedições tenham participado da observação — como uma britânica liderada por Arthur Eddington na Ilha de Príncipe —, os dados brasileiros foram mais precisos. “Por muitos anos, os créditos foram atribuídos quase exclusivamente à expedição inglesa, o que revela um viés eurocêntrico recorrente na história da ciência”, afirma.

Alcaniz também lembra que o GPS usado hoje depende diretamente das correções relativísticas formuladas por Einstein. “A comprovação feita em Sobral não apenas validou uma teoria revolucionária, mas também mudou para sempre a forma como entendemos a gravidade e o espaço-tempo”, reforça.

Visão eurocêntrica e ambiguidades no diário

Se por um lado Einstein se impressionou com figuras como o psiquiatra Juliano Moreira — pioneiro no combate ao racismo científico — e o general Cândido Rondon — que ele chegou a indicar ao Nobel da Paz —, por outro, expressou em seus escritos uma visão marcadamente eurocêntrica e, por vezes, preconceituosa.

“Esses camaradas são palestrantes excepcionais. Quando elogiam alguém, eles elogiam — a eloquência. Acredito que tal tolice e irrelevância tenham relação com o clima”, escreveu. Em outro trecho, afirmou: “Aqui sou uma espécie de elefante branco para eles, e eles são macacos para mim”. Tradutores de seu diário, como Tolmasquim, ponderam que o termo “macacos”, no contexto da época, remetia à ideia de ingenuidade, não sendo necessariamente um insulto racial — embora isso não anule seu tom depreciativo.

Einstein também demonstrou entusiasmo pela diversidade étnica nas ruas do Rio: “A miscelânea de povos nas ruas é deliciosa: Portugueses, índios, negros e tudo no meio, de modo vegetal e instintivo, dominado pelo calor.” No entanto, utilizou várias vezes o termo “índios” como sinônimo de selvageria.

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Para Tolmasquim, o cansaço da longa viagem e a falta de diálogos científicos mais profundos frustraram as expectativas do cientista. “Ele já vinha há mais de um mês em viagem, e sentia que seus esforços para discutir a nova física encontravam poucos pares no Brasil”, explica.

A frase final que Einstein registrou antes de embarcar de volta à Europa, em 12 de maio de 1925, resume seu estado de espírito: “Longos discursos com muito entusiasmo e excessiva adulação, mas sinceros. Graças a Deus acabou. Finalmente livre, mas mais morto que vivo”.

Centenário será celebrado com exposições e debates

A efeméride dos 100 anos da visita de Einstein ao Brasil será marcada por eventos em diversas instituições. O Museu de Astronomia e Ciências Afins, no Rio, prepara uma programação especial com exposições, palestras e a reedição de trechos do diário de Einstein. A Fiocruz também destacará, em mostra comemorativa, o exemplar assinado por Einstein da revista Annalen der Physik, atualmente preservado na Biblioteca de Manguinhos.

Além disso, a Academia Brasileira de Ciências e o Observatório Nacional planejam sessões solenes e painéis sobre o impacto da visita de Einstein na consolidação da ciência brasileira.

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