A vacina oral contra poliomielite (VOP, na sigla em inglês), popularmente conhecida como “gotinha”, será oficialmente aposentada no Brasil em menos de dois meses. A dose será substituída pela vacina inativada poliomielite (VIP, na sigla em inglês), aplicada de forma injetável. De acordo com Ana Frota, representante do Comitê Materno-Infantil da Sociedade Brasileira de Infectologia, a previsão é que a retirada da VOP em todo o país ocorra até 4 de novembro.
A decisão de substituir a vacina oral pela injetável tem o aval da Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização (CTAI) e é recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A VOP, que contém o vírus enfraquecido, foi essencial no controle da poliomielite em várias partes do mundo, mas, em condições sanitárias inadequadas, pode levar a casos de pólio derivados da vacina, o que acontece com menor frequência do que as infecções por poliovírus selvagem.
Durante a 26ª Jornada Nacional de Imunizações, realizada no Recife, Ana Frota destacou que, embora a vacina tenha desempenhado um papel crucial na erradicação da poliomielite, chegou o momento de mudar a abordagem. “Quando se vacina o mundo inteiro com a VOP, você tem muitos casos. E quando eles começam a ser mais frequentes que a doença em si, é a hora em que as autoridades públicas precisam agir”, afirmou.
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Ana também ressaltou que a vacina oral será mantida em alguns casos específicos, como no controle de surtos, algo que ocorre atualmente em regiões como a Faixa de Gaza, no Oriente Médio, onde quatro casos de paralisia flácida foram notificados — dois já descartados para pólio, um confirmado e outro ainda em investigação. A troca pela vacina injetável no Brasil é vista como uma decisão lógica, segundo a especialista, que afirmou que a medida é parte de um esforço global para eliminar os riscos associados à vacina oral.
Vacinação e lacunas
A campanha de substituição da VOP pela VIP é uma das várias ações globais que tentam recuperar as perdas na cobertura vacinal ocorridas durante a pandemia de Covid-19. Entre 2019 e 2021, cerca de 67 milhões de crianças ao redor do mundo perderam parcial ou totalmente doses de vacinação de rotina, incluindo contra a poliomielite. “A própria iniciativa global [Aliança Mundial para Vacinas e Imunização, parceria da OMS] teve que parar a vacinação contra a pólio por quatro meses durante a pandemia”, lembrou Ana Frota. Ela destacou que emergências humanitárias, conflitos e falta de acesso também têm comprometido a imunização de milhões de crianças, criando lacunas na proteção.
A mudança no Brasil
O Ministério da Saúde anunciou em 2023 que passaria a adotar exclusivamente a VIP no reforço aplicado aos 15 meses de idade, anteriormente feito com a vacina oral. A vacina injetável já vinha sendo aplicada nas três primeiras doses do calendário vacinal, administradas aos 2, 4 e 6 meses de vida. Com a mudança, o reforço da vacina contra a pólio, que antes era aplicado aos 4 anos, será eliminado, já que o esquema vacinal com quatro doses injetáveis é considerado suficiente para garantir proteção contra a doença.
A decisão foi baseada em critérios epidemiológicos, evidências científicas sobre a vacina e recomendações internacionais. No Brasil, não há registros de casos de poliomielite desde 1989, mas a queda nas taxas de vacinação nos últimos anos tem preocupado autoridades de saúde, que veem na mudança para a VIP uma forma de aumentar a segurança e recuperar a confiança na imunização.
A mudança é parte de um esforço contínuo para erradicar a poliomielite em todo o mundo e garantir que novas gerações de crianças estejam protegidas da doença, sem os riscos associados ao uso da VOP em áreas vulneráveis. Mesmo com a eliminação da pólio no Brasil, a vigilância epidemiológica e a vacinação continuam sendo essenciais para evitar o retorno do vírus.