Alta do valor da areia para construção civil impulsiona mercado ilegal de fornecedores, atingindo R$ 20 bilhões em 2021

Estudo revela que areia pode chegar a 60% de ilegalidade, com impactos ambientais e perdas fiscais estimadas em R$ 370 milhões

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Com a valorização da areia no setor da construção civil, o mercado ilegal de fornecedores alcançou cifras alarmantes, chegando próximo aos R$ 20 bilhões em 2021, de acordo com dados disponíveis. Uma pesquisa inédita, realizada pelo pesquisador Luiz Fernando Ramadon para a TV Brasil, revelou que a ilegalidade na extração de areia pode representar em média 60% do total. Em 2015, os valores atingiram aproximadamente R$ 9 bilhões. A exploração de areia para infraestrutura e construção civil é uma das maiores atividades de mineração no país em volume, ficando atrás apenas da mineração de ferro, e pode ter um grande impacto ambiental.

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A metodologia desenvolvida por Ramadon, que é policial federal e mestre em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), estima o nível de ilegalidade comparando-o com a produção anual de cimento Portland, principal insumo do setor e diretamente relacionado ao consumo local de areia. As perdas fiscais estimadas por Ramadon chegam a R$ 370 milhões.

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Essa exploração ilegal ocorre tanto em iniciativas sem registro quanto quando empresas licenciadas excedem as áreas permitidas, o que só pode ser combatido por meio de uma fiscalização constante e adequada.

Um perigo adicional é a presença do crime organizado nessa atividade, que, de acordo com Ramadon, “não é constante, mas está em crescimento. Para construir um condomínio ilegal em uma área proibida ou de proteção ambiental, as milícias se infiltram em vários setores da construção civil, incluindo a extração de areia”, afirmou o pesquisador.

A TV Brasil noticiou em março uma operação que resultou na apreensão de equipamentos utilizados na extração ilegal de areia em Seropédica e Itaguaí, na Baixada Fluminense.

O estudo revelou índices de ilegalidade que chegam a 58% no país. A região Sudeste é a que apresenta o maior consumo total, com 64 mil toneladas, e estima-se que 42% desse mercado seja ilegal. No Nordeste, o segundo maior consumidor, a taxa de ilegalidade é ainda maior, chegando a 86%, com 48.757 toneladas, representando quase um terço do total de extração ilegal de areia no país e superando inclusive o volume total extraído ilegalmente no Sudeste, que é estimado em 46.986 toneladas.

Todos os estados do Nordeste enfrentam problemas de ilegalidade, com taxas acima de 90% no Rio Grande do Norte (93,67%) e no Piauí (91,65%). Em termos de volume, os maiores problemas estão na Bahia, onde quase 13 mil toneladas foram comercializadas ilegalmente, seguida pelo Ceará, com 7.500 toneladas, e Pernambuco, com 7.163 toneladas, representando um mercado que movimenta até R$ 6 bilhões.

Os resultados são ameaças, exploração irresponsável e pressão sobre as comunidades locais, como relatou o historiador e ativista Casé Angatu Tupinambá. Morador da região de Ilhéus, ele destacou que nas áreas de extração existem fluxos constantes de caminhões. Segundo ele, na região “existem pessoas que exploram a areia, chamadas de mineradoras. Algumas delas até dialogam com os parentes, caciques e líderes, mas outras não estabelecem qualquer tipo de diálogo. Elas extraem a areia em áreas que não são visíveis, explorando as nascentes dos rios. Isso acaba destruindo completamente os rios, porque estão extraindo areia em regiões da Mata Atlântica, que são áreas de qualidade. É uma quantidade imensa de caminhões carregados de areia.”

De acordo com Angatu, algumas iniciativas prometem realizar o replantio e a preservação dessas áreas, mas isso nem sempre ocorre na prática.

Além da pressão sobre o solo, que expõe as populações rurais a ameaças e agressões, a questão ambiental também é um fator importante quando se trata da ilegalidade na extração de areia. O professor Edilson Pizzato, do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (USP), destaca que a extração sem os devidos cuidados pode levar à erosão e ao colapso das cavas, com riscos de alterações no regime hidrológico das áreas próximas e contaminação das fontes de água por partículas, incluindo rejeitos, uma vez que o material destinado à construção civil passa por um processo de separação antes de ser transportado em caminhões.

Devido ao baixo custo do transporte, as cavas localizadas nas proximidades das cidades podem impactar um número considerável de pessoas. Pizzato explica que, ao escavar, a parte subterrânea em que a água está presente fica exposta ao ambiente, o que favorece a entrada de diversos tipos de poluentes, sejam eles químicos ou orgânicos, além das partículas geradas pela erosão, que permanecerão suspensas nesse reservatório de água.

Os projetos de extração legalizados devem incluir planos de manejo e recuperação, com a redução da área aberta e seu aproveitamento em outras atividades, como a adaptação dessas áreas como espaços públicos.

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Devido aos riscos envolvidos, as cavas de extração têm sido deslocadas para as periferias das cidades e exigem uma fiscalização constante. O avanço da ocupação urbana e a poluição também representam obstáculos. A dragagem de rios poluídos, como o Tietê, em São Paulo, produz areia que não pode ser utilizada na construção civil devido ao alto grau de contaminação.

A fiscalização da extração de areia é um processo complexo que envolve órgãos ambientais, o Ministério Público e a polícia em todas as esferas governamentais. Em nível federal, a Agência Nacional de Mineração (ANM), antigo Departamento Nacional de Produção Mineral, e o Ibama são responsáveis pela fiscalização. Além disso, os órgãos fiscais federais e estaduais e as polícias também desempenham papéis na supervisão, fiscalização e repressão das atividades ilegais.

Embora o mercado de areia tenha aumentado tanto em volume quanto em valor desde 2015, a fiscalização diminuiu, especialmente entre 2020 e 2022. Segundo o Ibama, a Coordenação de Licenciamento Ambiental de Mineração realizou apenas 12 inspeções em empreendimentos licenciados entre 2017 e 2022. As inspeções conjuntas com outros órgãos resultaram em algumas dezenas de autos de infração nos últimos anos.

Houve uma queda de cerca de 45% no número de inspeções do Ibama entre 2017 e 2022. Em 2017 e 2018, foram registrados 25 e 30 autos de infração, respectivamente, números que diminuíram para 18 em 2019, 13 em 2020, 13 em 2021 e 14 em 2022.

Na ANM, o cenário também é preocupante. Em 2018, foram realizadas 797 ações de fiscalização em campo. Porém, entre 2020, 2021 e 2022, o total de ações foi de apenas 687, todas relacionadas a lavras legalizadas, nas quais a presença de órgãos técnicos inibe a extração não declarada.

A reportagem entrou em contato com a assessoria da Polícia Federal, mas não obteve resposta até o momento da publicação.

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