Um estudo inédito liderado pelo etnobotânico indígena Hemerson Dantas dos Santos Pataxó Hãhãhãi, doutorando do Instituto de Ciências Ambientais, Químicas e Farmacêuticas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), resgatou e registrou o conhecimento ancestral do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe sobre plantas medicinais. A pesquisa foi realizada na Terra Indígena Caramuru/Paraguassu, no sul da Bahia, e catalogou 175 plantas utilizadas tradicionalmente para fins terapêuticos.
A investigação começou com o objetivo de identificar tratamentos para as três enfermidades mais recorrentes entre os Pataxó Hã-Hã-Hãe: verminoses, diabetes e hipertensão. Ao longo do estudo, Hemerson constatou que, para essas doenças, os indígenas recorrem principalmente ao mastruz, à moringa e ao capim-cidreira, respectivamente. Do total de plantas catalogadas, 79% têm usos corroborados por literatura científica recente.
Além do resgate dos saberes, a pesquisa também revelou como a história de expulsão, deslocamento forçado e devastação ambiental afetou o conhecimento tradicional e a própria flora local. Muitas das plantas utilizadas atualmente são espécies exóticas, introduzidas no território após a invasão das terras indígenas por fazendeiros na década de 1940, quando a reserva chegou a ser extinta pelo governo estadual. O território só foi reconhecido novamente nos anos 1980, após disputas judiciais e conflitos que persistem até hoje.
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“Grande parte da cobertura de mata se perdeu e virou pastagem. Muitas plantas citadas pelos anciões já eram difíceis de localizar ou desapareceram completamente”, relatou Hemerson. Sua orientadora, Eliana Rodrigues, destacou a importância do trabalho: “Hemerson não apenas registrou o conhecimento do seu povo, mas também o resgatou.”
Como desdobramentos, a pesquisa vai resultar em um livro sobre as descobertas, outro com receitas para uso seguro das plantas, um audiovisual e a implantação de um viveiro para cultivar e distribuir mudas entre as aldeias da região.
Segundo Eliana, Hemerson é o primeiro pesquisador etnobotânico do mundo a investigar sua própria cultura e território com essa profundidade. “O termo etnobotânico descreve a relação entre os povos e suas plantas, para fins medicinais, alimentares, de construção ou qualquer outra utilidade”, explica.
Com a criação do viveiro e a publicação dos resultados, Hemerson espera que o conhecimento ancestral dos Pataxó Hã-Hã-Hãe sobre a natureza e suas propriedades medicinais seja preservado e fortalecido para as futuras gerações.