Febre oropouche avança pelo Brasil e já registra mais mortes em 2025 do que em todo o ano passado

Com 11.805 casos confirmados em 18 estados e no Distrito Federal, doença que era restrita à Amazônia atinge regiões distantes como o Espírito Santo, que lidera o ranking nacional. Especialistas apontam influência do desmatamento, mudanças climáticas e mobilidade de trabalhadores rurais na expansão do vírus.

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A febre oropouche, antes concentrada nos estados da Região Amazônica, se espalhou pelo Brasil em ritmo alarmante. Até julho deste ano, o país já contabiliza 11.805 infecções confirmadas e cinco mortes, superando o total de óbitos registrados em todo o ano de 2024, quando foram quatro vítimas. Os dados do Ministério da Saúde indicam que a situação tende a se agravar: praticamente todas as semanas de 2025 já apresentam mais casos que os mesmos períodos do ano anterior, que terminou com 13.856 notificações.

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O Espírito Santo, a quase 3 mil quilômetros da Amazônia, tornou-se o epicentro da doença no país, com 6.318 registros. O estado, com cerca de 4 milhões de habitantes, reúne condições ideais para a proliferação do mosquito vetor Culicoides paraensis, conhecido como maruim ou mosquito-pólvora. Áreas periurbanas com plantações e matéria orgânica em decomposição oferecem ambiente propício para o ciclo do vírus.

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Segundo o subsecretário estadual de Vigilância em Saúde do Espírito Santo, Orlei Cardoso, a disseminação local da doença coincidiu com o período de colheita do café, que atrai trabalhadores de outras regiões. “Eles passam uma semana em uma cidade, depois seguem para outra, o que favorece a propagação do vírus em diferentes municípios”, explica.

Nova linhagem e influência do desmatamento

Pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) identificaram que a atual epidemia é impulsionada por uma nova linhagem do vírus oropouche. O chefe do Laboratório de Arbovírus e Hemorrágicos da instituição, Felipe Naveca, aponta que essa variante surgiu no Amazonas, espalhou-se pelo Norte do país e alcançou outras regiões. “Mostramos que o cenário está diretamente relacionado com áreas de desmatamento recente, no sul do Amazonas e norte de Rondônia, que funcionaram como pontos de dispersão do vírus”, afirma.

Estudos revelam ainda que eventos extremos, como secas e enchentes, alteram o ecossistema de mosquitos e animais hospedeiros, ampliando o risco de surtos. Um levantamento internacional que avaliou dados de seis países da América do Sul concluiu que variáveis climáticas — como aumento das temperaturas e mudanças no regime de chuvas — foram responsáveis por 60% da disseminação da oropouche, com destaque para o impacto do El Niño.

Risco para gestantes e medidas de prevenção

A febre oropouche apresenta sintomas semelhantes aos da dengue e chikungunya, como febre, dor de cabeça, no corpo e nas articulações. Contudo, a infecção pode provocar complicações graves na gestação, incluindo microcefalia, malformações fetais e óbito do bebê. O Ministério da Saúde orienta que grávidas em áreas afetadas redobrem os cuidados, utilizando roupas compridas, repelentes e preservativos, mesmo sem comprovação de transmissão sexual do vírus.

Em nota, o Ministério informou que tem reforçado o monitoramento dos casos, com visitas técnicas e reuniões periódicas com estados e municípios. Em parceria com a Fiocruz e a Embrapa, estão em andamento estudos com inseticidas para controle do vetor, com resultados preliminares promissores.

Ceará também em alerta

A Região Nordeste também entrou no mapa da oropouche. O Ceará já soma 674 casos em 2025. De acordo com o secretário executivo de Vigilância em Saúde do estado, Antonio Lima Neto, a doença inicialmente se concentrou na zona rural do Maciço de Baturité, mas este ano avançou para a cidade de Baturité, com cerca de 20 mil habitantes. “Essa transição mostra a tendência da urbanização dos surtos, o que exige respostas mais complexas de saúde pública”, afirma.

O estado também registrou a morte de um feto por complicações decorrentes do vírus. Em 2024, foram cinco casos de óbito fetal e um de anomalia congênita associados à doença. O Ceará tem investido em vigilância laboratorial e no treinamento de profissionais para distinguir a oropouche de outras arboviroses, como dengue, zika e chikungunya.

“O mosquito-pólvora não é domiciliado como o Aedes aegypti. Para conter sua ação, seria necessário criar uma barreira química entre áreas de plantação e residências, algo tecnicamente desafiador”, explica Lima Neto.

Perspectivas e desafios

Com o vírus se expandindo rapidamente em territórios com pouca ou nenhuma imunidade populacional, a febre oropouche representa um novo desafio para o sistema de saúde pública brasileiro. O controle da doença exigirá ações integradas de vigilância, manejo ambiental, resposta clínica e investimento em pesquisa.

Além de ampliar a prevenção, estados e municípios enfrentam o desafio de adaptar suas estratégias sanitárias a uma nova realidade epidemiológica marcada pelo impacto das mudanças climáticas, da mobilidade humana e do desequilíbrio ecológico. A oropouche, antes esquecida na floresta, agora bate à porta das cidades.

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