Estudo inédito no Brasil revela microplásticos em cordões umbilicais e expõe risco global à saúde de bebês

Pesquisa pioneira realizada em Maceió é a primeira da América Latina a detectar partículas plásticas em cordões umbilicais; descoberta levanta alerta internacional sobre impactos da poluição desde a gestação.

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Um estudo inédito realizado no Brasil identificou pela primeira vez na América Latina a presença de microplásticos em cordões umbilicais e placentas de recém-nascidos. A pesquisa, conduzida em Maceió (AL), revela que bebês estão expostos à poluição plástica ainda no útero. Os resultados, considerados alarmantes, foram publicados nesta sexta-feira (25) nos Anais da Academia Brasileira de Ciências, colocando o Brasil no centro de uma discussão global sobre os efeitos da poluição na saúde humana.

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As análises foram realizadas com amostras de dez gestantes atendidas pelo Hospital Universitário Professor Alberto Antunes e pelo Hospital da Mulher Dra. Nise da Silveira. As partículas foram identificadas por meio de espectroscopia Micro-Raman, técnica que detecta com alta precisão a composição química das substâncias presentes nos tecidos analisados.

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Os resultados mostraram 110 partículas de microplásticos nas placentas e 119 nos cordões umbilicais. Os principais compostos encontrados foram o polietileno, comum em embalagens plásticas descartáveis, e a poliamida, presente em tecidos sintéticos.

“Achávamos que a placenta atuava como uma barreira, mas 8 em cada 10 participantes tinham mais microplásticos no cordão umbilical do que na própria placenta. Isso significa que essas partículas estão chegando diretamente aos bebês, antes mesmo do nascimento”, explica o pesquisador Alexandre Urban Borbely, da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), líder do grupo de pesquisa em Saúde da Mulher e da Gestação.

Ligação internacional e comparação com os EUA

Desde 2021, Borbely investiga os efeitos da exposição a microplásticos durante a gravidez. Em 2023, uma parceria com a Universidade do Havaí, nos Estados Unidos, já havia revelado a presença dessas partículas em placentas de mulheres havaianas. O estudo também indicou aumento da contaminação ao longo do tempo: microplásticos foram encontrados em 60% das amostras colhidas em 2006, em 90% em 2013 e em 100% em 2021.

A pesquisa em Maceió contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), além de manter a colaboração com os cientistas norte-americanos. Apesar de todas as amostras brasileiras estarem contaminadas, elas apresentaram menor quantidade de aditivos químicos associados aos plásticos do que as amostras dos EUA.

“Buscamos mulheres atendidas pelo SUS, com maior vulnerabilidade social. A maioria dos estudos anteriores foi feita em países desenvolvidos. Queríamos retratar a nossa realidade. Os polímeros variam conforme o local e os hábitos de consumo da população”, afirma Borbely.

Possíveis fontes de contaminação

Segundo o pesquisador, não é possível determinar com exatidão a origem dos microplásticos, já que essas partículas estão presentes no ar, na água e nos alimentos. Contudo, ele destaca dois fatores que podem influenciar a exposição no contexto local: o consumo frequente de frutos do mar, como peixes e moluscos filtradores — muito comuns na alimentação da população alagoana —, e o uso de água mineral envasada, que tende a acumular microplásticos com mais facilidade, especialmente quando os galões são expostos ao sol.

Expansão da pesquisa e preocupação com a saúde dos bebês

Com o objetivo de aprofundar os impactos da contaminação, a equipe ampliará a pesquisa para 100 gestantes. A nova etapa buscará correlações entre os níveis de microplásticos e possíveis complicações gestacionais ou problemas de saúde nos recém-nascidos. Para isso, está sendo implementado em Alagoas o Centro de Excelência em Pesquisa de Microplástico, com recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Os resultados devem ser publicados até 2027.

“A preocupação é grande, porque toda uma geração já está nascendo com exposição a plásticos ainda no útero. Um estudo americano mostrou que certos polímeros estão ligados à prematuridade. Já publicamos pesquisas mostrando que o poliestireno passa facilmente pela placenta, alterando o metabolismo e gerando radicais livres, o que pode afetar o desenvolvimento fetal”, alerta Borbely.

Alerta para políticas públicas

Borbely defende que as descobertas devem servir como alerta coletivo e ponto de partida para políticas públicas mais rígidas.

“Ações individuais têm pouco efeito nesse caso. O Brasil não tem regulamentação específica para a produção e o descarte de plásticos. É urgente que o governo estabeleça regras para as indústrias, com filtros, normas de descarte e redução da emissão. Reduzindo a poluição no ambiente, também reduziremos a contaminação em nossos corpos”, conclui.

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