O ex-coordenador de inteligência da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Adiel Pereira Alcântara, afirmou nesta segunda-feira (19) que a corporação realizou ações de “policiamento direcionado” para barrar o trânsito de eleitores petistas durante o segundo turno das eleições presidenciais de 2022.
Adiel prestou depoimento ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), como testemunha de acusação na ação penal contra o chamado Núcleo 1 da trama golpista, que inclui o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus.
Segundo o ex-coordenador, ordens partiram de ex-diretores da PRF para que agentes executassem blitze com foco específico em ônibus, cobrando abordagens aos veículos durante o período eleitoral. “Estavam criando uma polícia de governo, e não de Estado”, declarou.
Adiel também relatou que muitos agentes da corporação discordavam do envolvimento institucional com a imagem do então presidente. “Grande parte do efetivo não via com bons olhos esse vínculo. Ele participava de motociatas com motocicletas da PRF e publicava mensagens relacionadas a operações da corporação”, afirmou.
Outro depoente, o agente de inteligência Clebson Ferreira de Paula Vieira, também prestou esclarecimentos ao STF. Ele atuou no Ministério da Justiça durante a gestão do ex-ministro Anderson Torres e foi responsável por produzir relatórios de inteligência utilizados para fundamentar as ações da PRF.
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Segundo Vieira, os pedidos de levantamento partiram de Marília Alencar, então secretária de inteligência do ministério e atualmente também denunciada. Ele relatou ter ficado “apavorado” ao descobrir que seus relatórios foram utilizados para subsidiar decisões consideradas ilegais.
“À época, eu fiquei apavorado porque uma habilidade técnica foi utilizada para uma tomada de decisão ilegal”, afirmou. Vieira ainda destacou que algumas operações ocorreram em cidades sem fluxo de trânsito relevante. “O que aconteceu no segundo turno, eu sabia que ia acontecer. Por raciocínio, não por provas”, completou.
Os depoimentos desta etapa do processo vão de 19 de maio a 2 de junho e incluem 82 testemunhas indicadas pela acusação e pelas defesas. Após essa fase, os réus — incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro — serão interrogados. A data dos interrogatórios ainda não foi definida.
O julgamento do caso, que pode levar à condenação ou absolvição dos acusados, está previsto para ocorrer ainda em 2025. Os réus respondem pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça, e deterioração de patrimônio tombado.
Núcleo 1 da investigação
A ação penal atinge os integrantes do chamado Núcleo 1, considerado o núcleo central da tentativa de golpe, cuja denúncia foi aceita por unanimidade pela Primeira Turma do STF em 26 de março deste ano. São eles:
- Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
- Walter Braga Netto, general do Exército e ex-ministro da Defesa;
- Augusto Heleno, general do Exército e ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
- Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF;
- Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
- Paulo Sérgio Nogueira, general do Exército e ex-ministro da Defesa;
- Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator.
O STF apura se o grupo articulou um plano para desestabilizar o processo democrático e impedir a posse do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, por meio de ações institucionais, militares e de desinformação.