Entre os anos de 2022 e 2025, ao menos 222 pessoas apresentaram complicações oculares após passarem por procedimentos cirúrgicos realizados em mutirões oftalmológicos no Brasil. Desse total, cerca de 20% evoluíram para perda de visão em um ou nos dois olhos. Os dados são de um levantamento do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), com base em registros de eventos adversos divulgados pela imprensa nacional.
De acordo com o CBO, os casos apontam para a necessidade de maior atenção aos critérios de segurança e às exigências sanitárias na realização desse tipo de atendimento em larga escala. “Revela a gravidade do desrespeito aos critérios mínimos de segurança necessários para que atividades desse tipo sejam realizadas”, declarou a entidade.
Um dos episódios mais recentes ocorreu em Campina Grande, no agreste da Paraíba, no dia 15 deste mês. Após aplicação de medicações intraoculares durante o atendimento, mais de 30 pacientes apresentaram quadro de infecção ocular. “Eles estão sendo atendidos e tratados com cirurgias, mas há alto risco de perda visual”, informou o conselho.
Registros em diferentes estados
Casos semelhantes foram registrados em diversos estados brasileiros nos últimos três anos. Em 2022, um mutirão realizado em Rondônia com 140 procedimentos cirúrgicos resultou em 40 pacientes com infecção. No ano seguinte, no Amapá, 104 dos 141 pacientes atendidos em uma ação semelhante apresentaram complicações.
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Também em 2023, na capital do Pará, Belém, 22 de 40 pessoas operadas tiveram problemas pós-operatórios. Em Parelhas, no Rio Grande do Norte, uma falha no processo de higienização e esterilização dos equipamentos cirúrgicos levou à contaminação de 15 pacientes entre os 48 atendidos.
Já no interior de São Paulo, o caso mais recente veio a público no início de 2025: doze pessoas perderam a visão após um mutirão de cirurgias de catarata realizado em setembro do ano anterior, na cidade de Taquaritinga. Das 23 pessoas atendidas, mais da metade desenvolveu complicações. O Ministério Público de São Paulo (MPSP) instaurou procedimento para apurar o caso.
Recomendação de boas práticas
Com o objetivo de orientar a execução de mutirões oftalmológicos com maior segurança, o CBO lançou, em outubro de 2024, o Guia de Mutirões de Cirurgia Oftalmológica. A publicação foi destinada a gestores públicos e privados, profissionais da saúde e à população em geral.
O material apresenta recomendações baseadas em protocolos clínicos e em normas aprovadas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Entre as orientações, estão:
- Priorizar a realização dos atendimentos em unidades com histórico de prestação de serviços oftalmológicos;
- Garantir que os procedimentos sejam realizados por médicos com Registro de Qualificação de Especialista (RQE) em oftalmologia;
- Assegurar o monitoramento das ações por parte das vigilâncias sanitárias municipais ou estaduais;
- Acompanhar os pacientes por até 30 dias após as cirurgias;
- Comunicar imediatamente à vigilância sanitária qualquer evento adverso e suspender o mutirão em caso de infecção até que as causas sejam apuradas e medidas sejam adotadas.
Cuidados necessários
O Conselho Brasileiro de Oftalmologia reforça que a adoção desses cuidados é fundamental para garantir que os atendimentos ofereçam os benefícios esperados sem colocar em risco a saúde dos pacientes. “Para a entidade, esse cuidado é fator determinante para que os atendimentos gerem os efeitos desejados sem expor os pacientes a riscos evitáveis”, conclui a nota.
Embora os mutirões representem uma estratégia importante para ampliar o acesso à saúde ocular em diferentes regiões do país, o CBO destaca que a segurança do paciente deve ser sempre prioridade nas ações desse tipo.